Placa com cotação do dólar em vitrine de Buenos Aires, em 14 de abril (Luis Robayo/AFP)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 17 de abril de 2025 às 06h01.
A retirada das barreiras de o ao dólar, que entraram em vigor nesta semana na Argentina, deverão gerar uma ligeira alta na inflação do país no curto prazo, mas deve gerar uma queda na alta de preços mais à frente, avalia Ricardo Amarilla, economista sênior da consultoria Economatica e baseado no país vizinho.
“No curto prazo, haverá certa inflação. Os salários e serviços estavam defasados. Mas no médio prazo, talvez no próximo ano, a inflação começará a cair mais fortemente, porque há os dólares, há o ajuste fiscal, há todo esse entorno atacando a estrutura da inflação”, avalia.
“Em março, houve 3,7% de inflação, ou seja, nos próximos 2 a 3 meses haverá um certo aumento da inflação, mas como já se está trabalhando nas causas dela, como o ajuste fiscal que está sendo feito e com o trabalho em termos de política monetária, o impacto da depreciação nos preços, se estima, não será tão forte”, prossegue.
A inflação argentina caiu, de 211% ao ano no começo de 2024 para 55% ao ano em março, dado mais recente disponível, após ações do presidente Javier Milei em várias frentes. Veja a seguir mais trechos da conversa.
Como avalia a mudança a cambial feita na Argentina?
A abertura do controle cambial, embora não tenha sido completa, foi um o fundamental para que a economia argentina cresça. Para vários analistas, eu inclusive, a mudança chegou um pouco mais tarde do que o esperado, mas foi feita com os firmes. Isso me parece algo muito positivo e é o que se pode ver no mercado: uma certa tranquilidade na transição para um esquema um pouco mais flexível. Como a situação internacional é muito complexa, é necessário ter um esquema cambial mais flexível do que o anterior, que era muito rígido. Se não flexibilizarmos, quebra. Optou-se por algo intermediário, que são as bandas. O caminho de estabilização que a economia argentina está seguindo, se continuar em bom estado, deverá resultar em uma flexibilização cambial completa.
Quais foram as bases que Milei usou para fazer esta mudança?
O plano de estabilização tem duas âncoras muito importantes, a fiscal e a busca pelo saneamento do Banco Central, para ter uma política monetária que acompanhe o processo de estabilização. Um câmbio fixo era algo inviável. Na Argentina, estavam faltando dólares. É muito importante ter dólares para estabilizar uma economia. A relação com o presidente Donald Trump, dentro desse mundo tão caótico, foi positiva para o governo conseguir um desembolso tão grande do FMI, que este ano deve ser de 15 bilhões de dólares. O maior devedor do fundo é a Argentina, e [obter o empréstimo] foi uma demonstração de apoio externo muito forte. Agora é preciso que o Banco Central comece a acumular reservas próprias, com a consequente redução da inflação.
Quais serão os efeitos dessa mudança para os argentinos?
É preciso diferenciar entre o curto e o médio prazo. No curto prazo, haverá certa inflação. Os salários estarão defasados, os serviços estarão defasados. Mas no médio prazo, talvez no próximo ano, a inflação começará a cair mais fortemente, porque há os dólares, há o ajuste fiscal, há todo esse entorno atacando a estrutura da inflação. No período imediato, o câmbio, que já estava defasado, teve um salto de mais ou menos 11%. Isso implica que haverá um efeito para os preços. Estima-se que seja de um terço ou talvez um quinto. Dependendo de onde o dólar se estabilizar, pode ser entre 4% ou 5% de inflação extra da que já tínhamos. Em março, houve 3,7% de inflação, ou seja, nos próximos 2 a 3 meses haverá um certo aumento da inflação, mas como já se está trabalhando nas causas da inflação, como o ajuste fiscal que está sendo feito e com o trabalho em termos de política monetária, o impacto da depreciação nos preços, se estima, não será tão forte.
Como a mudança poderá impactar os investimentos nas reservas de petróleo e gás de Vaca Muerta?
Vaca Muerta é uma grande reserva, mas é necessário ter investimentos que viabilizem a extração desse petróleo, que já estão chegando, mas o controle cambial era uma barreira importante para isso. Todo investimento que vem de fora quer levar seus dividendos de volta, e o controle cambial impedia isso. Era um dos motivos pelos quais o investimento em Vaca Muerta estava bastante travado, sem andar na velocidade adequada. Estamos em uma etapa em que estamos exportando um pouco, mas ainda falta muito. Há pouco tempo, a Argentina começou a exportar gás ao Brasil através da Bolívia.
Quais deverão ser as próximas mudanças?
Se o Banco Central conseguir acumular reservas, o mais importante seria que os controles cambiais desaparecessem para sempre, porque temos vivido muitos anos com controles cambiais. Se chegarmos a esse ponto de construir a institucionalidade que nosso Banco Central e nossa moeda precisam, será possível eliminar a inflação e acabar com os controles cambiais, que são a principal barreira para o crescimento de qualquer economia.